Tragédia
e farsa na Câmara de Vereadores
Por Henrique Maynart
Na última segunda-feira, 12, o plenário da
câmara de vereadores de Aracaju testemunhou
a reedição da história, duplicação antagônica espremida nas 24 horas entre o
sol e a lua de um mesmo dia, peleja amiúde preconizada por um alemão barbudo nos idos do século 19. A primeira se apresentando como tragédia, a segunda
arrotando farsa e amarrando o desfecho da segunda-feira, requentando a história
humana em duas bandas que se batem, tal como expresso nas primeiras páginas do
“Golpe de 18 de Brumário”, escritos do velho Marx.
O
transporte público da capital, carente às deveras por acesso e transparência
nas planilhas e execuções de serviço, foi o palco de mais uma guerra santa,
dentre tantas santíssimas batalhas que brotam dos espíritos em idos de
campanha. A reedição da história a serviço do vislumbre dos que olham de longe,
provocando a justa fúria dos que labutam diligentes na pauta - faça chuva, sol
ou eleição - alcunhados por alguns setores da imprensa como “caras de pau”, e
tome pau. Quem acompanhou os trabalhos da casa legislativa da capital no início
da semana, tropeçou no “rendez vouz” das caneladas em direção ao pleito municipal de outubro, manobrando
o maquinário retórico para a terraplanagem das eleições que se aproximam a
passos largos.
Vereança arretada. A falsa tragédia
Manhã
de chuva na capital e Tribuna Livre agendada há cerca de um mês. A atividade
merecia a atenção de todos setores envolvidos, merecia. Para a surpresa dos que
acompanhavam a tribuna, a vereadora Karla trindade (PC do B) e o líder do
governo na CMA, Danilo Segundo (PSB), parlamentares que reivindicam a expressão
das pautas da juventude na casa, não se encontravam presentes na sessão e, até
as últimas informações, não justificaram
ausência ao plenário da CMA. A Tribuna discutiu o congelamento da tarifa
de transporte público, a redução da alíquota do ISS de 5% para 2%- medida que
onera os cofres do município em cerca de trezentos mil reais mensais - a
ausência da apresentação da planilha de lucros por parte da Setransp, a obsolescência dos carros que compõem a
frota da capital, os reajustes sucessivos na tarifa no decorrer de uma década,
a ausência de um processo de licitação para a execução do serviço da capital. No
mesmo dia, o prefeito entregou pessoalmente o projeto que reduz a alíquota do Imposto Sobre Serviços-ISS em
3%. Os militantes presentes na Tribuna Livre solicitaram aos vereadores que não
votassem este projeto, antes de um estudo detalhado sobre o impacto nas
receitas no município.
Em
Aracaju, perguntar ainda ofende, ao menos é o que aparentou nas declarações de
boa parte dos parlamentares do município na manhã de segunda-feira. Em posse da
fala no púlpito da CMA, o representante do movimento Não Pago, Aléxis Azevedo,
indagou os vereadores acerca do financiamento dos mandatos e campanhas
eleitorais daquela vereança, por parte do empresariado do setor de transportes.
O jovem militante apresentou uma indagação, nada singela, nada inoportuna, uma
indagação que traz razão de ser e de estar na disputa dos rumos da cidade. A
casa trovejou. Os vereadores Bertulino Menezes (PSB), Nitinho (DEM) e Rosangela
Dórea (PT) tomaram a indagação por acusação, deferindo sílabas de indignação e
repúdio à fala do jovem militante. Desrespeito? Por indagar? Declara que sim,
que não, que seja e que se veja.
Em
uma cidade cuja pujança empresarial se concentra no setor de transporte
coletivo, em um Estado onde o setor empresarial participa, diretamente ou
indiretamente, dos processos eleitorais,
vide as candidaturas de Adierson Monteiro (PSDB) e Laércio Menezes (PSC)
à primeira suplência das candidaturas de Albano Franco e Eduardo Amorim nas
eleições de 2010. Em uma cidade que apresenta um forte atrelamento político e
financeiro ao setor de transportes - atrelamento legítimo desde que esteja de
acordo com o que determina a legislação brasileira, bom frisar - não cabe
indagar os vereadores de que lado cada um samba? Gente certa é gente aberta, o debate precisa
desenrolar em panos claros.
Em
Aracaju, todo mundo se conhece, todos batem cabeça no mesmo terreiro, rezam na
mesma capela, bebericam nas mesmas biroscas. Até as pedras da coroa do meio e
as arquibancadas do Batistão sabem que
parte significativa das campanhas eleitorais é financiada por empresas de
transporte coletivo. Qual o problema em discutir as nuances de nossa cidade de
peito aberto?
Comitê em defesa da Licitação
No
dia 6 de fevereiro, o prefeito Edvaldo Nogueira (PC do B) anunciou, em entrevista coletiva, a primeira audiência
pública para a discutir a aferição da Licitação do transporte público da
capital. Na mesma oportunidade em que anunciou o congelamento da tarifa em R$
2,25, o prefeito reiterou que a abertura de Licitação para o setor está na
agenda de sua gestão para o ano de 2012.
A
vereadora Karla Trindade (PC do B), a mesma que se ausentou da Tribuna Livre
ocorrida na manhã de segunda-feira, organizou na tarde do mesmo dia a
inauguração do “Comitê em defesa da Licitação do Transporte”, juntamente com
uma série de organizações estudantis, populares e. sindicais. Boa parte destas
entidades presentes no evento, salvo honrosas exceções, sequer declarou apoio às mobilizações
contrárias ao reajuste da tarifa no início do ano. Frentes e organizações, tais
como a “Frente em Defesa do Transporte Público da Grande Aracaju” e o movimento
“Não pago” – este que ocupara a mesma tribuna no período da manhã - não foram
convidados para comparecer ao evento.
Questionada
em seu perfil no facebook, a parlamentar afirmou que “agora é hora de nos unimos para garantir um transporte
publico de qualidade, e a Licitação é importante nesse processo”.
Alguns questionamentos pairam por aqui: Se
agora é hora de unidade, por que os movimentos que construíram as
reivindicações contra o aumento da tarifa não foram convocados para a
construção do comitê? Se agora é hora de unidade, por que então a parlamentar
não compareceu, por que “gazeou” a Tribuna Livre ocorrida no mesmo dia, onde
foi discutido, dentre outros assuntos, o processo de Licitação do transporte?
Por que esta articulação não foi construída nos espaços que já estão colocados
na mobilização da sociedade, tal como a Frente em Defesa do transporte público
de Aracaju e da Grande Aracaju? E, não menos importante, por que articular um
comitê cuja única pauta já está fincada na agenda da prefeitura, reiterada em
todas as declarações de Edvaldo Nogueira na imprensa sergipana?
E aí,
beleza? É obvio que não.
Unidade se faz com os que agem, elencando as
pautas que lhe são comuns. Licitação é uma delas, não a única, mas todos os
setores interessados se esforçarão para galgar mais esta vitória para o povo de
Aracaju. Entretanto, articular um comitê cuja única pauta já está em curso,
cujo objetivo de sua inauguração – ao que aparenta – seria desviar a atenção de
outra atividade ocorrida na mesma casa, elencando o mesmo tema e mobilizando
uma pauta comum, é algo que não se engole mas nem com o “Sonrisal” mais potente
desta terra.
Manobrar um ajuntamento de organizações para
algo já está cantado e floreado aos
quatros ventos da capital, congrega um simples objetivo: Configurar a agenda da
prefeitura como uma “vitória da sociedade civil”, transfusando tragédia em
farsa e jogo de cena. As entidades presentes no comitê, comprometidas com a
pauta do transporte público - e comprometimento se observa na rua, no dia-dia
da pauta - estas organizações têm todo o direito e legitimidade de ocupar os
espaços que lhe apetecem no acúmulo da pauta, sem sombra de dúvida. Entretanto,
entidades como a direção do DCE-UFS, da USES, e da União da Juventude
Socialista - UJS (só pra ficar no eixo da juventude), direções e entidades que
apóiam e constroem a política do poder público municipal - direções que não
fizeram uma simples declaração de apoio às reivindicações contra o aumento da
passagem - se estas entidades e direções resolveram participar da noite para o
dia de um processo cuja construção não moveram uma palha no decorrer de 2012
ótimo, mas é no mínimo estranho que
estas entidades brotem da terra no embate. Fica o desejo de que estas entidades
continuem acompanhando todas as atividades, não apenas o Comitê da Licitação. Que
o povo de Aracaju consiga avançar na construção de um sistema de transporte
público, gratuito e de qualidade, respeitando os estudantes e a classe
trabalhadora. Aos que não foram às ruas, às praças e aos terminais de
integração, mas que foram ao gabinete do prefeito cantar a vitória do
congelamento da tarifa, fica o convite: O melhor amigo do povo é o povo
organizado.
Não esquecendo que é necessário ir além do transporte coletivo com base no uso de combustíveis fósseis, há que se lembrar do VLT, veiculo leve sobre trilhos, que pode interligar a periferia de Socorro e Socorro com a zona de expansão (Aruana) passando pelo DIA.
ResponderExcluirO Brasil não pode continuar deixando em segundo plano outras modalidade de transporte, assim como outras fontes de geração de energia.
E é fato, isso tem a ver com a qualidade da representação no legislativo e no executivo, por isso, procede a discussão sobre o financiamento eleitoral, com candidatos financiados por empresas privadas não há como esperar grandes mudanças.