terça-feira, 13 de março de 2012

Transporte público, tarifa e licitação: A volta dos que não foram.



 Tragédia e farsa na Câmara de Vereadores

Por Henrique Maynart

Na última segunda-feira, 12, o plenário da câmara de vereadores de Aracaju testemunhou a reedição da história, duplicação antagônica espremida nas 24 horas entre o sol e a lua de um mesmo dia, peleja amiúde preconizada por um  alemão barbudo nos idos do século 19. A primeira se apresentando como tragédia, a segunda arrotando farsa e amarrando o desfecho da segunda-feira, requentando a história humana em duas bandas que se batem, tal como expresso nas primeiras páginas do “Golpe de 18 de Brumário”, escritos do velho Marx.

O transporte público da capital, carente às deveras por acesso e transparência nas planilhas e execuções de serviço, foi o palco de mais uma guerra santa, dentre tantas santíssimas batalhas que brotam dos espíritos em idos de campanha. A reedição da história a serviço do vislumbre dos que olham de longe, provocando a justa fúria dos que labutam diligentes na pauta - faça chuva, sol ou eleição - alcunhados por alguns setores da imprensa como “caras de pau”, e tome pau. Quem acompanhou os trabalhos da casa legislativa da capital no início da semana, tropeçou no “rendez vouz” das caneladas  em direção ao pleito municipal de outubro, manobrando o maquinário retórico para a terraplanagem das eleições que se aproximam a passos largos.

Vereança arretada. A falsa tragédia

Manhã de chuva na capital e Tribuna Livre agendada há cerca de um mês. A atividade merecia a atenção de todos setores envolvidos, merecia. Para a surpresa dos que acompanhavam a tribuna, a vereadora Karla trindade (PC do B) e o líder do governo na CMA, Danilo Segundo (PSB), parlamentares que reivindicam a expressão das pautas da juventude na casa, não se encontravam presentes na sessão e, até as últimas informações, não justificaram  ausência ao plenário da CMA. A Tribuna discutiu o congelamento da tarifa de transporte público, a redução da alíquota do ISS de 5% para 2%- medida que onera os cofres do município em cerca de trezentos mil reais mensais - a ausência da apresentação da planilha de lucros por parte da Setransp,  a obsolescência dos carros que compõem a frota da capital, os reajustes sucessivos na tarifa no decorrer de uma década, a ausência de um processo de licitação para a execução do serviço da capital. No mesmo dia, o prefeito entregou pessoalmente o projeto que reduz  a alíquota do Imposto Sobre Serviços-ISS em 3%. Os militantes presentes na Tribuna Livre solicitaram aos vereadores que não votassem este projeto, antes de um estudo detalhado sobre o impacto nas receitas no município.

Em Aracaju, perguntar ainda ofende, ao menos é o que aparentou nas declarações de boa parte dos parlamentares do município na manhã de segunda-feira. Em posse da fala no púlpito da CMA, o representante do movimento Não Pago, Aléxis Azevedo, indagou os vereadores acerca do financiamento dos mandatos e campanhas eleitorais daquela vereança, por parte do empresariado do setor de transportes. O jovem militante apresentou uma indagação, nada singela, nada inoportuna, uma indagação que traz razão de ser e de estar na disputa dos rumos da cidade. A casa trovejou. Os vereadores Bertulino Menezes (PSB), Nitinho (DEM) e Rosangela Dórea (PT) tomaram a indagação por acusação, deferindo sílabas de indignação e repúdio à fala do jovem militante. Desrespeito? Por indagar? Declara que sim, que não, que seja e que se veja.

Em uma cidade cuja pujança empresarial se concentra no setor de transporte coletivo, em um Estado onde o setor empresarial participa, diretamente ou indiretamente, dos processos eleitorais,  vide as candidaturas de Adierson Monteiro (PSDB) e Laércio Menezes (PSC) à primeira suplência das candidaturas de Albano Franco e Eduardo Amorim nas eleições de 2010. Em uma cidade que apresenta um forte atrelamento político e financeiro ao setor de transportes - atrelamento legítimo desde que esteja de acordo com o que determina a legislação brasileira, bom frisar - não cabe indagar os vereadores de que lado cada um samba?  Gente certa é gente aberta, o debate precisa desenrolar em panos claros.

Em Aracaju, todo mundo se conhece, todos batem cabeça no mesmo terreiro, rezam na mesma capela, bebericam nas mesmas biroscas. Até as pedras da coroa do meio e as arquibancadas do Batistão sabem  que parte significativa das campanhas eleitorais é financiada por empresas de transporte coletivo. Qual o problema em discutir as nuances de nossa cidade de peito aberto?

Comitê em defesa da Licitação

No dia 6 de fevereiro, o prefeito Edvaldo Nogueira (PC do B) anunciou,  em entrevista coletiva, a primeira audiência pública para a discutir a aferição da Licitação do transporte público da capital. Na mesma oportunidade em que anunciou o congelamento da tarifa em R$ 2,25, o prefeito reiterou que a abertura de Licitação para o setor está na agenda de sua gestão para o ano de 2012.

A vereadora Karla Trindade (PC do B), a mesma que se ausentou da Tribuna Livre ocorrida na manhã de segunda-feira, organizou na tarde do mesmo dia a inauguração do “Comitê em defesa da Licitação do Transporte”, juntamente com uma série de organizações estudantis, populares e. sindicais. Boa parte destas entidades presentes no evento, salvo honrosas exceções,  sequer declarou apoio às mobilizações contrárias ao reajuste da tarifa no início do ano. Frentes e organizações, tais como a “Frente em Defesa do Transporte Público da Grande Aracaju” e o movimento “Não pago” – este que ocupara a mesma tribuna no período da manhã - não foram convidados para comparecer ao evento.

Questionada em seu perfil no facebook, a parlamentar afirmou que “agora é hora de nos unimos para garantir um transporte publico de qualidade, e a Licitação é importante nesse processo”.

Alguns questionamentos pairam por aqui: Se agora é hora de unidade, por que os movimentos que construíram as reivindicações contra o aumento da tarifa não foram convocados para a construção do comitê? Se agora é hora de unidade, por que então a parlamentar não compareceu, por que “gazeou” a Tribuna Livre ocorrida no mesmo dia, onde foi discutido, dentre outros assuntos, o processo de Licitação do transporte? Por que esta articulação não foi construída nos espaços que já estão colocados na mobilização da sociedade, tal como a Frente em Defesa do transporte público de Aracaju e da Grande Aracaju? E, não menos importante, por que articular um comitê cuja única pauta já está fincada na agenda da prefeitura, reiterada em todas as declarações de Edvaldo Nogueira na imprensa sergipana?

E aí, beleza? É obvio que não.

Unidade se faz com os que agem, elencando as pautas que lhe são comuns. Licitação é uma delas, não a única, mas todos os setores interessados se esforçarão para galgar mais esta vitória para o povo de Aracaju. Entretanto, articular um comitê cuja única pauta já está em curso, cujo objetivo de sua inauguração – ao que aparenta – seria desviar a atenção de outra atividade ocorrida na mesma casa, elencando o mesmo tema e mobilizando uma pauta comum, é algo que não se engole mas nem com o “Sonrisal” mais potente desta terra.

Manobrar um ajuntamento de organizações para algo  já está cantado e floreado aos quatros ventos da capital, congrega um simples objetivo: Configurar a agenda da prefeitura como uma “vitória da sociedade civil”, transfusando tragédia em farsa e jogo de cena. As entidades presentes no comitê, comprometidas com a pauta do transporte público - e comprometimento se observa na rua, no dia-dia da pauta - estas organizações têm todo o direito e legitimidade de ocupar os espaços que lhe apetecem no acúmulo da pauta, sem sombra de dúvida. Entretanto, entidades como a direção do DCE-UFS, da USES, e da União da Juventude Socialista - UJS (só pra ficar no eixo da juventude), direções e entidades que apóiam e constroem a política do poder público municipal - direções que não fizeram uma simples declaração de apoio às reivindicações contra o aumento da passagem - se estas entidades e direções resolveram participar da noite para o dia de um processo cuja construção não moveram uma palha no decorrer de 2012 ótimo, mas é no mínimo estranho  que estas entidades brotem da terra no embate. Fica o desejo de que estas entidades continuem acompanhando todas as atividades, não apenas o Comitê da Licitação. Que o povo de Aracaju consiga avançar na construção de um sistema de transporte público, gratuito e de qualidade, respeitando os estudantes e a classe trabalhadora. Aos que não foram às ruas, às praças e aos terminais de integração, mas que foram ao gabinete do prefeito cantar a vitória do congelamento da tarifa, fica o convite: O melhor amigo do povo é o povo organizado.






Um comentário:

  1. Não esquecendo que é necessário ir além do transporte coletivo com base no uso de combustíveis fósseis, há que se lembrar do VLT, veiculo leve sobre trilhos, que pode interligar a periferia de Socorro e Socorro com a zona de expansão (Aruana) passando pelo DIA.
    O Brasil não pode continuar deixando em segundo plano outras modalidade de transporte, assim como outras fontes de geração de energia.
    E é fato, isso tem a ver com a qualidade da representação no legislativo e no executivo, por isso, procede a discussão sobre o financiamento eleitoral, com candidatos financiados por empresas privadas não há como esperar grandes mudanças.

    ResponderExcluir